Requisição de casas privadas do Zmar viola a Constituição, alerta Ordem dos Advogados - TVI

Requisição de casas privadas do Zmar viola a Constituição, alerta Ordem dos Advogados

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  • 3 mai 2021, 17:22
Zmar

De acordo com o bastonário, a requisição “chegaria se não estivesse em causa o domicílio privado de pessoas”

A Ordem dos Advogados defendeu esta segunda-feira que a requisição temporária do complexo turístico Zmar, em Odemira (Beja), para alojar trabalhadores agrícolas devido à covid-19, não pode abranger casas privadas, sob pena de violar a Constituição.

Após visitar o empreendimento turístico, no concelho de Odemira (Beja), o bastonário da Ordem dos Advogados (OA), Luís Menezes Leitão, invocou o artigo 34, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP) para argumentar que a requisição civil do complexo não pode abranger as casas privadas aí existentes.

O artigo 34, n.º 2 da Constituição diz expressamente que ninguém entra no domicílio de outra pessoa sem uma ordem judicial e, precisamente por isso, espero que a Constituição seja respeitada”, alertou.

Segundo Menezes Leitão, a requisição civil decretada pelo Governo ao Zmar Eco Experience, na freguesia de Longueira-Almograve, com 260 habitações, das quais cerca de 100 são do complexo e as outras 160 são particulares, “chegaria se não estivesse em causa o domicílio privado de pessoas”.

A Constituição protege o domicílio, seja ele qual for”, argumentou, reafirmando: “O que nós temos é um despacho do Governo. Não temos nenhuma ordem judicial”.

Depois de conversas com diversos proprietários de casas no empreendimento, o bastonário da OA disse compreender “a situação dramática” dos trabalhadores agrícolas, sobretudo migrantes, de Odemira, concelho onde duas freguesias estão sob cerca sanitária, devido à elevada incidência de casos de covid-19.

Contudo, para Luís Menezes Leitão, a falta de condições de habitação para estes trabalhadores “tem origem numa resolução do Conselho de Ministros de outubro de 2019, que permitiu 16 pessoas por unidade de alojamento, quatro por quarto e umas área de 3,4 metros quadrados” para os migrantes.

A resolução do problema deles é imperiosa”, mas “não deve passar pela ocupação de domicílios privados, porque a inviolabilidade do domicílio é uma garantia constitucional”, insistiu.

Para justificar a sua posição, o bastonário disse ainda que também “a nível de direitos humanos” é preciso não haver violações, aludindo ao “artigo 12 da Declaração Universal dos Direitos do Homem” e ao “artigo 8.º da Convenção Europeia”.

Lembrando que o estado de emergência já não está em vigor, Menezes Leitão considerou que o Governo, ao decretar a requisição do Zmar, provocou “uma mistura de situações bastante diferentes”, porque “uma coisa é a requisição de empreendimentos turísticos” ou “comerciais” e outra “é a de habitações privadas”, sejam elas de primeira ou de segunda habitação.

O caso de primeira habitação ainda mais grave, porque a pessoa é colocada na rua precisamente neste quadro de pandemia. Mas, mesmo sendo de segunda, é um caso de violação da intimidade da vida privada” e, a partir do momento em que acabou o estado de emergência, “não podem mais ser suspensos os direitos fundamentais das pessoas”, assinalou.

Já no que toca ao núcleo de casas pertencente ao complexo turístico, Luís Menezes Leitão disse não colocar “o mesmo problema” relativo às habitações privadas.

No sábado, a OA anunciou ter solicitado a intervenção da sua Comissão de Direitos Humanos para analisar esta questão da requisição do Zmar e, questionado pela agência Lusa, o bastonário destacou que o mesmo organismo vai debruçar-se sobre a falta de condições de habitação para os trabalhadores rurais do concelho, como é o caso da sobrelotação.

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