O mês de janeiro foi o mais mortal desde que há registo e a pandemia foi a grande responsável. Em apenas 31 dias, morreram mais de 5.500 pessoas de covid-19 e este número teve um impacto direto no número de funerais e cremações. A maioria das mortes ocorreu na região de Lisboa e os crematórios não aguentaram a pressão.
Paulo tem 48 anos e perdeu a mãe. Clementina começou a apresentar sintomas num sábado e três dias depois morreu em casa.
O filho contactou a agência funerária, que lhe disse que a cremação iria durar cinco a seis dias, mas um erro burocrático da GNR da Trafaria atrasou ainda mais a despedida: a Guarda Nacional Republicana não terá enviado a tempo o expediente para o tribunal e Paulo esperou 14 dias para fazer o funeral da mãe.
O elevado número de mortes por covid-19, em janeiro, acabou por pressionou os cemitérios e os crematórios e as famílias tiveram que esperar pelo menos uma semana por uma vaga num crematório, o que prolongou a dor e o sofrimento.
Formaram-se filas de caixões que se amontoaram nas câmaras frigoríficas dos hospitais e os crematórios acabaram por dar prioridade aos corpos covid.
A pandemia tirou a dignidade à morte: os corpos são colocados em sacos e os caixões são selados e desinfetados. As vítimas de covid-19 não chegam sequer a ir à igreja e não há velório. O funeral acontece à porta dos crematórios, na rua, porque os corpos destas vítimas não podem sequer entrar nas casas mortuárias.
A morte em tempos de pandemia tornou-se ainda mais dura e fria: não há uma despedida física e o número de pessoas que pode ir ao funeral é também muito limitado.
A covid-19 roubou uma despedida digna e tornou-a num “longo adeus”.