Beja: bebé morre no parto por causa do atraso na cesariana de urgência - TVI

Beja: bebé morre no parto por causa do atraso na cesariana de urgência

Atraso na cesariana de urgência terá sido fatal para bebé de 40 semanas que morreu durante o parto. Entidade Reguladora da Saúde enviou processo para Ordens dos Médicos e dos Enfermeiros

Um bebé de 40 semanas e cinco dias de gestação morreu no Hospital José Joaquim Fernandes, em Beja, durante o parto. Segundo a Entidade Reguladora da Saúde, para o óbito terão concorrido falhas nos procedimentos médicos, além da demora de meia hora a iniciar-se uma cesariana de urgência.

O caso consta de uma deliberação, de 7 de setembro, da Entidade Reguladora da Saúde (ERS). De acordo com a Agência Lusa, o organismo emitiu uma instrução à Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, que integra o hospital. Aí insta os serviços a adotarem os procedimentos necessários para garantir “o direito dos utentes à prestação de cuidados de saúde de qualidade e com segurança e em tempo útil e adequado à situação concreta de cada utente”.

Morte antes de nascer

O caso avaliado remonta a 9 de abril de 2015. Uma mulher deu então entrada no hospital por volta das 18:00 com as águas rebentadas.

Segundo o relatório da ERS, baseado nos depoimentos dos envolvidos, o registo cardiotocográfico (CTG) não apresentou alterações significativas até cerca da uma da manhã do dia 10 de Abril de 2015. A partir dessa hora, começou a apresentar desacelerações mais profundas e repetidas..

Entre as cerca das 2:00 e 2:20 da madrugada este registo mostrava taquicardia fetal com diminuição da variabilidade da frequência cardíaca fetal. Situação que se agravou após as 4:00, com o aparecimento de desacelerações profundas e repetidas.

Perante estas alterações “que fariam pressupor um estado fetal não tranquilizador”, a enfermeira de serviço resolveu chamar o médico de serviço. Eram umas 4:30.

"Desvalorizou as alterações"

De acordo com a deliberação, o médico “desvalorizou as alterações do cardiotocograma”, não dando aparentemente qualquer indicação precisa quanto a atitudes a tomar à enfermeira. Assim, esta “apenas julgou necessário” chamar de novo o clínico por volta das 6:30, “quando surgiu um novo agravamento do traçado cardiotocográfico”. Tinham já passado doze horas, desde que a grávida dera entrada no hospital.

A essa hora, o médico tomou a decisão de fazer uma cesariana de emergência. Mas a grávida demorou “30 minutos a chegar ao bloco operatório, o que foi justificado pela distância existente entre o bloco de partos e bloco operatório central, onde as cesarianas são realizadas”.

Neste pormenor, a ERS salienta haver uma norma da Direção-Geral de Saúde que estabelece que o tempo entre a decisão de fazer uma cesariana e o seu início, o corte da pele, não deve ultrapassar os 15 minutos.

Sem batimento cardíaco

Os registos hospitalares dão conta de que o batimento cardíaco do bebé era audível no bloco de partos. Mas já não se ouvia quando chegou ao bloco operatório, o que leva “a pressupor que a ocorrência da morte fetal tenha ocorrido neste lapso de tempo”.

De notar ainda que no relatório do internamento, no que diz respeito ao diário clínico, apenas está registado a nota de entrada feita às 18:55 do dia 09 de Abril de 2015, sem outras anotações de factos ocorridos após essa hora, não tendo sido por isso possível colher dados sobre instruções dadas às enfermeiras quanto à vigilância do trabalho de parto ou outras atitudes médicas”, lê-se no relatório.

Conclui a ERS que, quer o médico, quer a enfermeira, “não agiram segundo a "legis artis".

Com o cuidado que lhes era devido e exigido, comportamento esse passível de consubstanciar infração disciplinar e consequente aplicação de medida disciplinar”, como salienta a ERS.

Falhas apontadas

O relatório acusa assim que a enfermeira, perante o quadro clínico apresentado pela utente grávida, deveria ter chamado mais cedo o obstetra de serviço. Bem como proceder aos registos de forma correta e atempada e não à posteriori.

Isto porque, o último registo no diário de enfermagem (que possui os registos de observações e atitudes tomadas pelas enfermeiras durante o turno) foi elaborado às 07:19 e reporta “apenas à posteriori o sucedido entre as 03:00 e as 06:40”. Algo que a enfermeira admitiu ter sido “um erro”.

Já quanto ao clínico de serviço, aquando da primeira chamada pela enfermeira, “não deveria ter desvalorizado as alterações do cardiotocograma, ou seja, deveria ter intervindo de imediato, o que não aconteceu, não dando o necessário relevo, a necessária importância a uma situação que do ponto de vista clínico o justificava”, considera a Entidade Reguladora da Saúde.

Com os comportamentos referidos ambos os profissionais não agiram conforme seria de esperar, recomendava e esperava”, refere o relatório, acrescentando ainda que “também a distância entre a ala de obstetrícia e o bloco operatório terão contribuído para a demora na intervenção e consequentemente para o desfecho final”.

O processo foi enviado para as Ordens dos Médicos e dos Enfermeiros, por a ERS "entender que poderão estar em causa princípios de “legis artis” que terão sido violados”.

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