Bairros sociais: «Viveiros de delinquentes» - TVI

Bairros sociais: «Viveiros de delinquentes»

  • Portugal Diário
  • 8 mar 2008, 18:13

Padre José Maia lamenta que crianças e jovens estejam a ser «espalhados» pela cidade do Porto sem qualquer rede de apoio Milhares de famílias em barracas Setúbal tem centenas de clandestinos O Aleixo é um inferno Solução é «demolir o bairro do Aleixo» Porto: há quem tenha medo de viver no Cerco Famílias recusam sair de bairro degradado Porto é uma das cidades da Europa com mais bairros

O ditado popular «Quem semeia ventos colhe tempestades» é frequentemente utilizado pelo padre José Maia, presidente da fundação Filos, para criticar a política social da Câmara do Porto que, em seu entender, potencia a criação de «viveiros de delinquentes».

«Estão a ser criados viveiros de potenciais delinquentes», alertou em declarações à Lusa, referindo-se aos «bandos» de crianças e jovens que estão a ser «espalhados» pela cidade sem qualquer rede de apoio.

Esta população, no caso concreto do Bairro de S. João de Deus, onde a autarquia tem em curso desde há vários anos um processo faseado de demolição dos blocos, era acompanhada por técnicos que trabalham há muitos anos no terreno, mas «ao serem deslocados, esse apoio acaba-se», alertou.

«Há muita malta jovem desintegrada. São jovens excluídos e desamparados», frisou o pároco que acompanha desde 1977 os moradores do S. João de Deus e de outros bairros da zona Oriental do Porto.

«Confundem-se conceitos de exclusão, inclusão, coesão e reinserção»

O desabafo de quem dedicou «uma vida a isto» e agora vê a cidade «a regressar a 75», é acompanhado por críticas «às políticas que conduzem a um processo de empobrecimento físico, ético, mental e educativo».

«Confundem-se os conceitos de exclusão, inclusão, coesão e reinserção. Não há uma estratégia nacional para fazer a ponte entre a exclusão e a inclusão» e «faltam actores de inserção social, capazes de remendar os «laços» dos que se sentem fragilizados», frisou.

O padre José Maia, que já foi presidente da União das Instituições Particulares de Solidariedade Social, é padre na paróquia da Areosa e presidente da fundação Filos que tem como objectivo promover iniciativas de respostas sociais através de projectos de intervenção junto de pessoas, famílias ou grupos em situação de pobreza ou exclusão.

«Num terreno que não é cultivado nasce o mato, num bairro abandonado nascem as condições para delinquência», alertou o padre Maia. Segundo este dirigente associativo, «esta Câmara [do Porto] pensa que acaba com o tráfico de droga deitando abaixo as casas. Foi essa a mensagem passada no Bairro de S. João de Deus, mas as casas vieram quase todas abaixo e o tráfico continuou».

Consumo de droga transferiu-se do «Tarrafal» para outros bairros

O Bairro de S. João de Deus, que nasceu em 1944, era um dos maiores complexos de habitação social da cidade do Porto e também um dos mais problemáticos. O «Tarrafal», como ficou conhecido, foi um dos principais centros de tráfico e consumo de droga da Área Metropolitana do Porto, chegou a ter cerca de quatro mil habitantes e 630 fogos, estando actualmente reduzido a meia dúzia de blocos. Até há pouco tempo, passavam diariamente pelo bairro de S. João de Deus cerca de 1.500 toxicodependentes, nada comparado aos dias de hoje.

Em declarações à Lusa, o coordenador do projecto Arrimo (de apoio a toxicodependentes), da Fundação Filos, disse que a afluência de consumidores de droga ao Bairro de S. João de Deus «baixou drasticamente», porque foram deslocados para outros bairros da cidade, como o Aleixo, o Cerco, Pinheiro Torres, Lagarteiro e outros.

«Os traficantes deslocaram-se, mas mantiveram aqui [no S. João de Deus] uma filial. Este local continua a ser procurado, apesar dos excluídos se estarem a adaptar à dinâmica do tráfico e estarem a passar gradualmente para os outros pontos de venda».

Segundo António Caspurro, «registaram-se mudanças num curto espaço de tempo aqui e nos outros bairros, mas em sentido inverso, de acordo com as intervenções autárquicas e policiais que, lamentavelmente, sempre foram desligadas da intervenção social que é feita no terreno».

Com essas medidas, sublinhou, «transferem-se os problemas e perde-se o trabalho realizado. É um processo longo que, infelizmente, fica interrompido».
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