"Alexandra Borges": “As pessoas são quase obrigadas a viver em segredo, nas sombras” - TVI

"Alexandra Borges": “As pessoas são quase obrigadas a viver em segredo, nas sombras”

  • Paula Martins
  • 21 jan 2020, 23:34

Há mais de um ano que a lei prevê o uso da canábis para fins medicinais mas, até ao momento, apenas um medicamento foi aprovado

A situação denunciada pela TVI, sobre os milhares de pacientes sem acesso a tratamento à base de canábis, foi o tema da grande reportagem do espaço de investigação “Alexandra Borges”. Após a exibição da peça, quatro convidados debateram o tema na TVI24.

Há mais de um ano que a lei prevê o uso da canábis para fins medicinais mas, até ao momento, apenas um medicamento, reservado a um número pequeno de doentes, chegou às farmácias e custa 300 euros por mês.

Milhares de doentes, não tem sequer qualquer medicamento disponível no mercado. São empurradas para o estrangeiro, onde é mais fácil aceder a este tratamento, e onde têm o acompanhamento médico que não existe em Portugal. Muitos recorrem ao mercado negro, onde arriscam a sua saúde, ou ao auto-cultivo, que é crime em Portugal, e arriscam a sua liberdade para poder tratar-se.

Raúl das Neves, da empresa Aurora, líder de produção mundial de canábis medicinal, falou acerca do processo de aprovação de medicamentos com base na canábis medicinal em Portugal. “Tudo o que é cultivado em Portugal é para o mercado externo”, afirmou.

A Aurora, empresa canadiana que opera em Portugal, enviaram dois produtos para aprovação, em Outubro, mas ainda não obtiveram resposta do Infarmed, a autoridade responsável pela aprovação de medicamentos em Portugal. Os dois produtos submetidos, são precisamente dois dos mais aprovados, e foram escolhidos precisamente para “testar” a celeridade do processo.

Os processos de licenciamento em cada país são bastante diferentes uns dos outros”, sublinhou Raúl das Neves. “Existem dificuldades legais porque a canábis é um produto com restrições”, explicou.

Outro dos participantes do debate foi Carla Dias, do Observatório da Canábis e mãe de uma menina que precisa de CBD, uma das substâncias presentes na canábis, para sobreviver. “Temos uma lei que nos autoriza a ter a substância e nós não temos acesso a ela”, criticou Clara.

Carla quis fazer a distinção, relembrando estar a falar "sobre canábis medicinal", devido ao estigma que ainda existe por parte de muitas pessoas.

A filha de Clara sofre de epilepsia refratária e a compra de CBD é feita “através da Internet, como muita gente faz”. A única forma que tem de se certificar de que o produto que compra é fidedigno é através das análises que pede à marca. “Escolhemos uma marca e compramos o CBD”, elucidou.

O único medicamento aprovado para venda em Portugal é o Sativex, um medicamento desenvolvido para tratar a esclerose múltipla. O preço do medicamento “é superior à maior parte das reformas em Portugal”, garante Dinis Dias, da Associação de Estudos da Canábis.

A introdução de um medicamento no mercado pode levar sete anos”, disse.

Na hora de apontar culpas, Dinis Dias diz que tudo se trata de uma “descoordenação a nível político e a nível das tutelas”, entre o Infarmed e a Direção-Geral de Alimentação e Veterinária.

Garcia Pereira, jurista, diz que ainda é necessário “ultrapassar o estigma” sobre uma substância cujas capacidades “estão demonstradas” em algumas patologias.

Há um estigma social à volta disto”, garantiu Paula Martins, autora da reportagem. “As pessoas são quase obrigadas a viver em segredo, nas sombras. Há pessoas que vivem com medo de serem apanhadas”, sublinhou.

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