Escolas públicas e privadas: rankings avaliam o que deviam? - TVI

Escolas públicas e privadas: rankings avaliam o que deviam?

Escola [Foto: Lusa]

Qualidade das escolas ou dos alunos? Podia ser mais aquilo que une os dois setores do que aquilo que os separa? E a felicidade dos estudantes, deveria ser medida? Ficam as perguntas e o que defendem os líderes educativos

Os rankings  das escolas voltam a colocar o ensino privado à frente do público, a uma distância ainda considerável. O presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas defende que estas tabelas avaliam a qualidade dos alunos que fazem exame e não o mérito ou a dinâmica das escolas. Já a associação de escolas privadas entende, por sua vez, que as escolas públicas deviam adotar regras seguidas pelos pelos colégios.

O diretor executivo da Associação dos Estabelecimentos do Ensino Particular e Cooperativo (AEEP), Rodrigo Queiroz e Melo, fez notar à Lusa que, em 15 anos de existência destas listas, há escolas que “de forma constante estão no fundo da tabela”.


“A nossa proposta é que se olhe com cuidado para aqueles que não saem do lugar. Em 15 anos a única semelhança que há entre os alunos é terem frequentado aquela escola. Parece-nos que não se pode deixar de olhar com cuidado para essas tendências e a sociedade pensar qual a melhor forma de ultrapassar esses ciclos de pobreza”


Se as escolas privadas têm ocupado, de forma regular, os lugares cimeiros das classificações, este responsável entende que a justificação não será necessariamente uma diferença no investimento ou orçamento entre privado e público.

“O que falta é olhar-se bem para as condições regulatórias das escolas estatais e dar-lhes condições mais parecidas com as do privado. Se calhar também falta desassossegar um bocadinho as pessoas, para que não nos centremos naquilo que são as regras laborais, mas mais naquilo que é o desafio do ensino", afirmou.

"Acho que as questões de liderança, termos um projeto educativo consistente, a possibilidade de recrutarmos e termos corpos docentes estáveis, isso é absolutamente fundamental, é parte importante do sucesso, e isso não implica mais investimento”


O diretor executivo da AEEP entende ainda que, numa altura em que foram eliminados os exames do 4.º ano de escolaridade, não se sabendo ainda se serão substituídos por provas de aferição,  “é preciso refletir”. “Se deixarmos de ter informação sobre o que se passa no 4.º ano de escolaridade vamos voltar a uma certa opacidade. É um recuo importante na questão da transparência e dos dados sobre o sistema e parece-nos que não é bom”.

Não podendo ser entendidos como “um sinal da boa escola”, estes rankings funcionam, defendeu, como um instrumento que permite aferir o trabalho realizado: “Há um ponto em que estamos todos de acordo, as escolas têm de ensinar. Os dados dos exames permitem perceber o que se passa, e responsabilizam as escolas”.
 

Privadas são melhores? "Errado"


Já Filinto Lima, da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas, adverte que os rankings deixam de fora o contexto social com que as escolas trabalham, desde a participação dos pais, à formação e à capacidade para pagar explicações.

“O que se percebe é que este instrumento de avaliação tem vindo a ser aperfeiçoado, mas está ainda longe do que seria desejável”, reconheceu também à Lusa o responsável escolar, acrescentando que não tem memória de qualquer medida educativa inovadora baseada neste tipo de informação.

O importante, frisou, é “o valor acrescentado da escola para o aluno”. Como exemplo, citou um estudo da Universidade do Porto segundo o qual os alunos que saem do ensino público concluem mais rapidamente o ensino superior.

“Ao olharem para estes rankings, os pais vão concluir que as escolas privadas são melhores, erradamente. Isto não é um ranking das escolas, é um ranking da qualidade dos alunos que frequentam essas escolas”.


Para Manuel Pereira, presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE), as escolas ficam com uma noção da posição em que se encontram com estas tabelas, mas é natural que os lugares cimeiros sejam ocupados pelos colégios, que trabalham normalmente num contexto mais favorecido.

Da mesma forma, entende as variações de posição conseguidas com poucos alunos, seja pela positiva ou pela negativa.

O responsável escolar considerou ainda que os exames no 4.º ano não fazem “sentido nenhum”, manifestando-se também favorável ao fim destas provas no 6.º ano de escolaridade.

Em termos gerais, observou que persistem as dificuldades em Português, Matemática, Física e Química e Biologia: “Não vejo grandes diferenças”.
 

Falta outra coisa: medir felicidade


Há dados que os rankings de escolas atuais não incluem, como a felicidade, a harmonia e o bem-estar que as escolas proporcionam aos alunos e suas famílias. Esta questão é sublinhada pelo investigador Adalberto Dias de Carvalho, que defende que esses indicadores deveriam existir. 

O especialista em Filosofia da Educação lança, assim, um repto à comunidade científica para se envolver neste estudo. “Os jornalistas lançaram esta matéria para o debate, têm esse mérito, mas não podem fazer tudo. Um estudo que falta fazer é o das consequências que estes rankings têm para a vida das escolas” e das comunidades, afirmou, em entrevista à Lusa, este que é o investigador principal do Instituto de Filosofia da Universidade do Porto.

Para Adalberto Carvalho, seria importante saber qual é a perceção que os professores, os pais e os avós têm dos resultados obtidos pela escola, “qual é o sentimento que a própria comunidade experimenta”.

Coordenador do Gabinete de Filosofia da Educação naquela instituição, o investigador advogou que este caminho é importante para uma cidadania democrática. No seu entender, os rankings não devem ser só o reflexo de um “treinamento de alunos” para fazerem exames.

“Pergunto-me se esses rankings medem aquilo que hoje em dia se considera muito importante em termos da evolução e do estado de desenvolvimento dos países que são os indicadores de felicidade dos alunos”


O investigador considerou que do ponto de vista político tendem a interessar sobretudo os resultados, na medida em que “influenciam a imagem” dos atores políticos. “Quando algumas críticas se fazem aos rankings, devemos questionar-nos sobre o que está a comunidade científica a fazer”, acentuou.

A questão, admitiu, é complexa, mas desafiante: “Carece de um estudo científico alargado, mas há meios para o fazer” ao nível dos instrumentos de aferição científica.

“Há indicadores que hoje em dia avaliam os índices de felicidade atingidos”. Exemplos? A coesão social e na própria escola, a imagem que os alunos têm dos professores, se gostam dos docentes ou se os admiram e como se sentem dentro do estabelecimento de ensino.

A escola tem de “facilitar a integração dos alunos na sociedade”, logo não pode assentar apenas num conceito de “meritocracia”, argumentou.

O ranking que idealiza deve conter as várias dimensões da escola, permitindo às famílias avaliar “a harmonia da formação” que ali é ministrada.


“É fundamental ir ver o que acontece depois das notas obtidas nos exames do secundário, quando falo de felicidade falo também na vida depois da escola e de realização, tanto pessoal como coletiva. Há formas de treinamento para se obter uma boa nota no final do secundário, os melhores explicadores não são necessariamente os melhores professores”


Adalberto Carvalho não tem dúvidas de que “o treinamento para obtenção de uma nota elevada” em exame - que vai depois posicionar as escolas no ranking, “não é a melhor forma de formar uma pessoa”. E o leitor, o que pensa disto? 

 
 
RANKING DAS ESCOLAS 2015
Ranking das escolas 4º ano  consulte aqui
Ranking das escolas 6º ano  consulte aqui
Ranking das escolas 9º ano  consulte aqui
Ranking ensino secundário  consulte aqui


 
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