Marroquino acusado de recrutar para Estado Islâmico livra-se de julgamento por terrorismo - TVI

Marroquino acusado de recrutar para Estado Islâmico livra-se de julgamento por terrorismo

  • Atualizada às 17:39
  • 22 jun 2018, 15:37
Campus de Justiça (arquivo)

Juiz de instrução Ivo Rosa considerou que “não se mostram" provados os indícios suficientes descritos na acusação. Abdesselam Tazi irá responder por crimes de falsificação de documento e contrafação de moeda

O Tribunal Central de Instrução Criminal decidiu esta sexta-feira não levar a julgamento, por crimes de terrorismo, o cidadão marroquino acusado de pertencer ao grupo Estado Islâmico e de recrutar operacionais em Portugal, a troco de 1.500 euros mensais.

Abdesselam Tazi, 64 anos, em prisão preventiva na cadeia de alta segurança de Monsanto, em Lisboa, está acusado pelo Ministério Público (MP) de oito crimes: adesão a organização terrorista internacional, falsificação com vista ao terrorismo, recrutamento para o terrorismo, financiamento do terrorismo e quatro crimes de uso de documento falso com vista ao financiamento do terrorismo.

Na leitura da decisão instrutória, o juiz Ivo Rosa sustentou que a prova apresentada pelo MP na acusação é “indireta”, acrescentando que dos factos imputados a Tazi não é possível inferir ou concluir que o arguido tenha atuado com o propósito de falsificar documentos, de financiar, de aderir ou de recrutar elementos para o Estado Islâmico ou para outra organização terrorista.

O juiz sublinhou que “não se mostram" provados os indícios suficientes quanto aos factos descritos na acusação relacionados com o terrorismo, razão pela qual não será julgado por esses factos.

O arguido, que se vai manter em prisão preventiva, foi pronunciado – vai ser julgado - apenas por um crime de falsificação de documento e por quatro crimes de contrafação de moeda.

"Meios de prove indireta"

Ivo Rosa colocou em causa a prova apresentada pelo MP que sustentaria as ligações ao terrorismo, e disse que a acusação formou a sua convicção “em meios de prova indireta”, que podem ter diversas leituras e interpretações.

O facto de Tazi ter utilizado passaportes e cartões de crédito falsos, ter viajado para a Turquia, estar na posse de manuscritos do Islão, ser muçulmano e ortodoxo, não haver prova direta de que radicalizou Hicham El Hanafi [detido em França desde 20 de novembro de 2016 por envolvimento na preparação de um atentado terrorista] não se pode, segundo o juiz, “extrair-se uma conclusão ou inferir que dos mesmos o arguido aderiu a uma organização terrorista ou que recrutou o Hicham El Hanafi”.

A acusação do MP refere que o arguido se deslocou várias vezes ao Centro de Acolhimento para Refugiados, no concelho de Loures, para recrutar operacionais para o Estado Islâmico, nomeadamente em agosto de 2015. Contudo o juiz Ivo Rosa aponta uma contradição na acusação, pois nessa data o arguido não se encontrava em Portugal.

O arguido, que se vai manter em prisão preventiva, foi pronunciado – vai ser julgado - apenas por um crime de falsificação de documento (relativo à falsificação do passaporte) e por quatro crimes de contrafação de moeda (relativos ao uso de quatro cartões de crédito falsos), que nada têm a ver com terrorismo ou com ligações terroristas.

O arguido será julgado por estes crimes em Aveiro – para onde o processo será remetido – pois foi nessa comarca “onde se consumou o crime de contrafação de moeda”.

O juiz de instrução criminal Ivo Rosa justificou a manutenção da medida de coação de prisão preventiva a Tazi com o perigo de fuga e de continuação da atividade criminosa.

Procuradores recorrem

Questionados pela agência Lusa, os procuradores do Ministério Público João Melo e Vítor Magalhães, responsáveis pelo inquérito e presentes na instrução – fase facultativa que visa decidir por um juiz se o processo segue para julgamento -, afirmaram que vão recorrer da decisão para o Tribunal da Relação de Lisboa.

Já o advogado do ex-polícia marroquino mostrou-se satisfeito com a decisão instrutória.

Estou contente com esta decisão, que é justa, objetiva, concreta e fundamentada. Não há indícios de que tenham sido praticados factos relacionados com o terrorismo”, disse Lopes Guerreiro aos jornalistas, à saída do Tribunal Central de Instrução Criminal, em Lisboa.

Segundo a acusação do MP, a que agência Lusa teve acesso, Abdesselam Tazi deslocou-se várias vezes ao Centro de Acolhimento para Refugiados, no concelho de Loures, para recrutar operacionais para esta organização, prometendo-lhes mensalmente 1.800 dólares norte-americanos (cerca de 1.500 euros).

Abdesselam Tazi fez-se sempre acompanhar de Hicham El Hanafi [detido em França desde 20 de novembro de 2016 por envolvimento na preparação de um atentado terrorista], que havia radicalizado e recrutado em Marrocos, antes de ambos viajarem para a Europa. O MP diz que o processo de refugiado, os apoios e a colocação em Portugal deste suspeito foram idênticos aos do arguido, tendo ambos ficado a viver juntos no distrito de Aveiro.

Pelo menos a partir de 23 de setembro de 2013, a principal atividade desenvolvida pelo arguido em Portugal consistia em auxiliar e financiar a deslocação de cidadãos marroquinos para a Europa e em obter meios de financiamento para a causa ‘jihadista’”, indica a acusação do Departamento Central de Investigação e Ação Penal.

O MP conta que Abdesselam Tazi "passou a visitar regularmente" o Centro de Acolhimento para Refugiados (CAR) “para dar apoio às pessoas em relação às quais organizara a sua vinda para Portugal e outros migrantes jovens que pudessem ser radicalizados e recrutados para aderirem ao Daesh” (acrónimo árabe do grupo extremista Estado Islâmico), procurando convencê-las de “que teriam uma vida melhor se aderissem ao Daesh e fossem viver para a Síria”.

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