Que futuro para o Snapchat depois da entrada em Bolsa - TVI

Que futuro para o Snapchat depois da entrada em Bolsa

  • Ricardo Tomé
  • 7 fev 2017, 19:00
Snapchat

Não fosse o caso de uma outra rede social, a corrida às ações da Snap.inc poderia ainda ser mais evidente; fala-se, claro, do Twitter

Nos últimos anos temo-nos habituado a conviver com o sucesso da maioria das plataformas sociais. Repito... da maioria. Longe vão os tempos da Grande Bolha de 1999-2001, em que empresas como o Friendster emergiram em força para gradualmente irem definhando ou mesmo fecharem num ápice. Nos últimos anos, contudo, os tempos parecem ser de sucesso e crescimento vertiginoso, com o desfecho a variar entre o assombroso lucro ou a compra imediata por um dos gigantes: Google, Facebook ou até mesmo Microsoft (que recentemente concluiu a aquisição do Linkedin).

Então e o Snapchat? A plataforma que dá rosto à empresa, batizada de Snap.inc, foi outrora notícia por ter-se negado a vender ao Facebook. Mas soube a trupe de Mark Zuckerberg reagir bem à nega de Evan Spiegel, o CEO da Snap.inc: se não os podes vencer nem juntar-te a eles... copia-os. E nisto e desde que o Instagram (propriedade do Facebook), copiou elementos característicos do Snapchat, tal como as Stories e opções de grafismo nas fotos e vídeos, bem como no Messenger as máscaras (marca quase registada do Snapchat), o crescimento da atividade no Snapchat abrandou.

O objetivo para a Snap.inc, a angariar com a entrada da empresa em Bolsa, são nada mais nada menos que 3 mil milhões de dólares, o que poderá significar uma valorização da empresa (que não tem sede e distribui todos os seus mais 1000 empregados por várias vivendas) de até 20 mil milhões.

De facto, os números recentes têm ajudado a empresa a manter o hype de que ainda goza; crescimento assombroso no número de membros (estimam-se 250 milhões/mês e confirmam-se 154 milhões/dia), aumento das receitas, maioritariamente de publicidade, e um acordo com a Google por 5 anos para ser o seu fornecedor dos serviços de cloud, o que indiciou a muitos confiança, dada a duração do acordo.

Mas dúvidas então porquê?

Não fosse o caso de uma outra rede social, a corrida às ações da Snap.inc poderia ainda ser mais evidente; fala-se, claro, do Twitter.

Qualquer uma das ‘major social networks’ nunca ofereceu más notícias. Mas sobretudo nos últimos dois anos são imensas as fatalidades adivinhadas e apregoadas à Yahoo! e algumas já ao Twitter. Parece, a muitos, que este é um mundo onde só os duopólios parecem ser possíveis de gerar sinergias e receitas capazes e alimentar os gigantes; Aos restantes resta o mercado de nichos; nos sistemas operativos móveis falamos portanto de Android vs iOS e aqui nas redes sociais de Google vs Facebook.

Mas voltemos ao Snap.inc. - com a entrada do processo para o IPO (Oferta Pública Inicial) a Snap teve de revelar números até aqui guardados sigilosamente. Mas desenganem-se os que esperam nestes momentos descobrir senão boas notícias; faz parte; afinal, it’s business, ou diremos mesmo it’s show business. Ainda assim, os argumentos apresentados são cativantes: média de cada um dos 154 milhões de utilizadores acede 18 vezes à app por dia num total de 25 minutos/dia. Que mais ficamos a saber? Que 404,5 milhões de dólares são a soma das receitas e as despesas de 520 milhões de dólares. Por outras palavras, o modelo de negócio do Snapchat, tal com a maioria das redes sociais, é de retorno a médio-prazo, com risco para investidores que queiram apostar no curto-prazo pois aqui só há sobretudo margens magras: cada nova rede social (tal como um projeto de Media, por exemplo) num primeiro momento pretende acima de tudo uma magnífica experiência, preterindo a presença de publicidade, ou colocando-a de forma muito discreta. Isto empurra as margens para baixo, pois se a popularidade da rede social é alta, cada novo utilizador que entra e chama os amigos significa mais custos para alojar registos e conteúdo dos utilizadores nos servidores, e pouca receita (por via de fraca agressividade comercial) que compense este custo à cabeça.

Esta pressão só abranda quando a fidelização dos utilizadores é conseguida e aumenta a notoriedade da plataforma e, sobretudo, as soluções comerciais e o namoro junto das marcas para nela anunciarem em força. É o que leva a que no momento presente cada utilizador do Snapchat nos EUA retorne à empresa 5,64 euros vs. os 62 que o Facebook já consegue. Leva tempo. Tempo que nem todos os investidores poderão querer esperar.

Por outro lado, o receio de muitos em perder a oportunidade de segurarem ações de uma nova empresa Unicórnio e ainda repleta de sex-appeal pode falar mais alto que todas as nuvens cinzentas. Isso e o facto inegável que, nos últimos anos, nenhuma outra empresa conseguiu de forma tão brilhante perceber e criar uma plataforma que ‘falasse’ aos adolescentes e lhes entregasse uma arena com as regras do jogo como eles realmente queriam.

Enquanto o Snapchat reinar neste campeonato, as apostas, acredita-se, manter-se-ão altas. Até mesmo com a pressão saudável do Instagram e do Messenger. Caberá portanto à dupla Evan Spiegel e Bobby Murphy manterem a inovação na plataforma (ir agora para além dos filtros e dos óculos Spectacles) e estar sempre um passo à frente da trupe de Zuckerberg, obrigando-os a serem apenas os copy-cats.

O maior risco para o Snapchat não está portanto na concorrência, mas sim na natureza do perfil dos seus utilizadores-core: os mais novos, para quem a fidelização seja ao que for tem a duração de uma lâmpada de filamento e a quem sempre faz sentido saltar e experimentar o que há de novo por aí. No Facebook, a heterogeneidade do seu público garante-lhe a resiliência, estabilidade e volume. No Snapchat combater a volatilidade iminente do seu público-alvo é, por isso, o segredo para sobreviver. O tempo dirá.

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