Ordem dos Médicos não deu parecer positivo ao curso de Medicina na Universidade Católica - TVI

Ordem dos Médicos não deu parecer positivo ao curso de Medicina na Universidade Católica

Entidade volta a mencionar pressões políticas para a abertura do curso

A Ordem dos Médicos veio esta quarta-feira esclarecer que não deu nenhum parecer positivo em relação ao curso de Medicina da Universidade Católica Portuguesa (UCP) que foi acreditado pela Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES).

Em comunicado a que a TVI24 teve acesso, a organização destaca que o último parecer enviado à A3ES data de 14 de agosto, tendo a ordem ficado sem resposta desde então.

Parecer da Ordem dos Médicos sobre curso de Medicina na UCP

A Ordem dos Médicos volta a referir aquilo que considera ser um "condicionamento político", lamentando uma decisão que "foi ao encontro do que era esperado, com a esfera política a prevalecer sobre a esfera técnica".

Em julho, o bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, acusou o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, de fazer uma “pressão brutal” sobre a A3ES  para a abertura de novos cursos de medicina.

O esclarecimento daquela entidade surge no seguimento das palavras do presidente da A3ES, que terá deixado a entender que a Ordem dos Médicos tinha dado um parecer positivo à abertura do curso de Medicina na UCP.

[O parecer da Ordem dos Médicos aponta reservas e] reitera que subsistem na proposta atual vários motivos de preocupação que colocam em causa a qualidade do curso", acrescenta o comunicado.

No parecer, a Ordem dos Médicos reconhece que houve melhorias, mas considera que ainda subsistem “vários motivos de preocupação (…) que colocam em causa a qualidade da proposta de ciclo de estudos da UCP”.

Um dos problemas apontados relaciona-se com os locais de estágio. A Ordem dos Médicos reconhece melhorias, nomeadamente um “contacto clínico mais completo”, mas alerta para algumas situações como o caso dos alunos que vão fazer “todo o estágio de Ginecologia/Obstetrícia e Pediatria em unidades sem bloco de partos e maternidade”, que estão previstos para os Hospitais da Misericórdia de Évora, Luz Setúbal, Luz Odivelas e Luz Torres de Lisboa.

No mesmo sentido aponta o estágio de Psiquiatria no Hospital Luz Arrábida, “que não tem internamento psiquiátrico, baseando-se apenas em consulta externa, coartando deste modo as possibilidades de contacto com muita da psicopatologia mais grave”.

Outro dos problemas levantados prende-se com o Hospital Beatriz Ângelo (HBA), que tem sido gerido em regime de parceria público-privada pelo Grupo Luz Saúde, mas cujo contrato termina em janeiro de 2022.

Com um novo concurso público, poderá surgir uma nova entidade gestora. Para a Ordem, tal mudança é “uma enorme ameaça ao ensino clínico deste ciclo de estudos, dado que esta instituição de saúde é, indubitavelmente, aquela que reúne as melhores condições para assegurar um processo de ensino/aprendizagem com qualidade".

A Ordem dos Médicos defende, por isso, que só se deveria viabilizar qualquer proposta alicerçada nesta instituição depois de conhecido o resultado do concurso.

O protocolo com a Universidade de Maastricht foi celebrado por nove anos, o protocolo com a Luz Saúde por 15 anos, e o da União das Misericórdias por seis anos. É, deste modo, evidente que a proposta apresentada não garante a realização de estágios clínicos em ambiente hospitalar do SNS, e que as dúvidas sobre a continuidade do HBA no projeto para além de 2021 têm todo o fundamento”, conclui a Ordem dos Médicos.

Para a Ordem dos Médicos, a instituição deveria acolher as recomendações feitas no relatório para que “a proposta possa estar em condições de poder oferecer um ciclo de estudos integrado de Mestrado em Medicina com a qualidade aceitável e exigível a nível nacional”.

A ministra da Saúde considerou que a aprovação do curso de Medicina na Universidade Católica Portuguesa vai dar a muitos portugueses, que de outra forma estudariam no estrangeiro, a oportunidade de se formarem no país.

Sabemos que há muitos portugueses que procuravam, tradicionalmente, a formação superior nesta área em outros países. Esta oferta formativa será uma oportunidade para eles terem a sua formação cá dentro e, eventualmente, ficarem também no país”, disse Marta Temido, durante a conferência de imprensa regular sobre a situação epidemiológica em Portugal.

Conselho de Escolas Médicas Portuguesas lamenta decisão

O Conselho de Escolas Médicas Portuguesas (CEMP) veio lamentar a criação de uma nova Faculdade de Medicina em Portugal, afirmando que lamenta "profundamente esta decisão", mas ressalvando que a mesma não contribui para o reforço do Ensino Médico e da Prática Médica em Portugal.

No comunicado enviado pelo CEMP é destacado que a "decisão foi tomada apesar das recomendações em sentido contrário por parte das estruturas que, em Portugal, representam quem é responsável pelo desenvolvimento e implementação da Educação Médica, a saber, o CEMP, a ANEM (Associação Nacional dos Estudantes de Medicina) e Ordem dos Médicos (OM)".

Para o CEMP, "a forte pressão exercida por vários agentes políticos, ao mais alto nível (...), terá sido, seguramente, a razão principal da tomada de decisão".

O comunicado evoca "o consenso" entre o CEMP, a Associação Nacional dos Estudantes de Medicina e a Ordem dos Médicos, que "têm o conhecimento adequado sobre o ensino médico em Portugal", sobre "a não oportunidade" de um novo curso de Medicina.

"Não queremos a vulgarização e banalização do ensino médico e, sobretudo, a desadequação àquilo que são as reais necessidades do país", advoga o CEMP, acrescentando que "aumentar a oferta formativa em Portugal contribui apenas para engrossar o número de médicos indiferenciados, sem saída profissional, que não seja a emigração ou a sujeição a contratações por empresas de fornecimento de serviços indiferenciados".

Tal só contribuirá para a descaracterização duma profissão, que se quer sempre regida pelos mais elevados padrões", invoca o Conselho de Escolas Médicas Portuguesas, assinalando que a sua posição "não tem nada contra qualquer universidade, privada ou pública".

A Universidade Católica apresentou um pedido inicial de acreditação em outubro de 2018, tendo esperado mais de um ano pela decisão da A3ES.

Em dezembro do ano passado, o Conselho de Administração da A3ES “chumbou” a acreditação do curso, tendo acatado os dois pareceres negativos que recebeu, um da Ordem dos Médicos e outro da comissão de avaliação de peritos nomeada pela agência.

Entre as falhas apontadas nos dois pareceres negativos estavam questões pedagógicas, a discordância da Ordem dos Médicos em relação a uma disciplina e ao tempo insuficiente de contacto com a prática clínica em hospitais.

Foi ainda considerada a sobreposição de oferta, uma vez que a abertura do curso representaria uma terceira formação em Medicina na região de Lisboa, e o facto de "parte do pessoal docente da nova faculdade ser retirado da Universidade de Lisboa e da Universidade Nova de Lisboa".

A Católica decidiu então apresentar uma nova proposta para acreditação do curso de Medicina, que foi agora aceite.

Continue a ler esta notícia

EM DESTAQUE