Siderurgia em Paio Pires tem dois meses para cumprir licença ambiental - TVI

Siderurgia em Paio Pires tem dois meses para cumprir licença ambiental

  • Atualizada às 17:47
  • 6 fev 2019, 16:38
Paio Pires (Seixal) - pó branco e preto

Inspeção notificou empresa devido ao “reiterado incumprimento” e “alarme social” provocado, com queixas constantes, devido a poeiras, de habitantes da localidade no Seixal

A Siderurgia Nacional, na Aldeia de Paio Pires, no Seixal, foi notificada para o cumprimento das condições da licença ambiental, “no prazo de 60 dias", avançou esta quarta-feira o inspetor-geral da IGAMAOT.

A decisão da Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT) de avançar com uma notificação à Siderurgia Nacional “para a implementação de uma medida cautelar”, que impõe o cumprimento das condições da licença ambiental, foi motivada pelo “reiterado incumprimento” da empresa e pelo “alarme social” provocado pela situação de poluição na Aldeia de Paio Pires, verificada em janeiro.

O inspetor-geral da IGAMAOT, Nuno Banza, falava no âmbito de uma audição na comissão parlamentar de Ambiente, requerida pelo grupo parlamentar do PCP, sobre os problemas ambientais na Aldeia de Paio Pires (distrito de Setúbal), devido a emissões difusas poluentes na atmosfera e de ruído provenientes da atividade industrial.

60 inspeções

Criada em 1999, a IGAMAOT já inspecionou 60 vezes a Siderurgia Nacional e nos últimos anos tem fixado coimas pelo incumprimento das condições da licença ambiental, avançou Nuno Banza, indicando que em 2011 foi fixada uma coima de 15 mil euros, que foi contestada em tribunal.

A empresa foi absolvida em 2013 e em 2017 voltaram a ser instaurados processos de contraordenação, mas ainda não há decisão judicial.

A mais recente inspeção à empresa foi em 29 de outubro de 2018, que verificou “um conjunto de incumprimentos das condições da licença”, disse o inspetor-geral, frisando que “nem se pode dizer que a inspeção foi a correr atrás do alarme de janeiro”.

Parece que, face a esta legislação, o crime compensa”, declarou o deputado do BE Pedro Filipe Soares, referindo-se ao valor das coimas por contraordenação ambiental e manifestando-se disponível para rever a lei.

"Determinaremos o encerramento"

Com uma posição semelhante, o deputado do PAN André Silva questionou o porquê de “um valor tão baixo” nas contraordenações e se existe algum tipo constrangimento ou pressão que impeça a revogação ou a suspensão da licença ambiental atribuída à Siderurgia Nacional.

Em resposta, Nuno Banza explicou que a IGAMAOT aplica as coimas que estão previstas na lei, acrescentando que a informação sobre os autos por incumprimento é comunicada à Agência Portuguesa do Ambiente (APA), entidade licenciadora que tem o poder de decisão sobre o futuro das licenças atribuídas.

Se amanhã a APA decidir retirar a licença à Siderurgia Nacional, nós determinaremos o encerramento, sem qualquer dificuldade, como fizemos noutras situações”, assegurou o inspetor-geral da IGAMAOT.

Redução de emissões

Entre as questões a resolver pela Siderurgia Nacional, “no prazo de 60 dias”, o responsável da IGAMAOT destacou o plano de redução de emissões difusas, as técnicas de operação e descargas industriais, a monitorização das partículas, o plano para a instalação das barreiras acústicas e de prevenção de emissões difusas, da redução do ruído e da redução do impacto visual.

Reconhecendo a importância da Siderurgia Nacional, que produz mais de um milhão de toneladas por ano e que emprega 375 trabalhadores diretamente e mais de 1.000 trabalhadores indiretamente, Nuno Banza reforçou que o desempenho ambiental tem que estar “à altura” do desempenho económico.

Questionada pela deputada do PSD Maria Luisa Albuquerque sobre qual “o horizonte temporal razoável para a resolução do problema”, o inspetor-geral adiantou que a expectativa é de que a empresa cumpra com as condições da licença ambiental no prazo de 60 dias.

A Aldeia de Paio Pires, concelho do Seixal, onde carros e edifícios têm estado cobertos de um pó branco, ultrapassou durante 15 dias em janeiro o valor-limite de partículas inaláveis, adiantou a associação ambientalista Zero.

Situação atmosférica “estacionária”

O episódio de poluição do ar na Aldeia de Paio Pires, no Seixal, registado em janeiro, pode estar relacionado com uma situação atmosférica “estacionária”, sem vento e chuva, afirmou o presidente da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), no Parlamento.

Há uma diferença entre o nível de qualidade do ar, resultante de vários fatores, como a exposição que o território português tem com regularidade a poeiras do deserto do Saara […], e as situações atmosféricas, como foi a que se verificou no início do ano, a que designamos a estabilidade atmosférica”, declarou Nuno Lacasta.

No âmbito de uma audição na comissão parlamentar de Ambiente, requerida pelo PCP, sobre os problemas ambientais na Aldeia de Paio Pires (distrito de Setúbal), o presidente da APA reforçou que o que se verificou durante o período do início do ano foi “uma situação de qualidade do ar estacionária, justamente monitorizada na estação de Paio Pires”.

De acordo com Nuno Lacasta, esta situação atmosférica está relacionada com “níveis da qualidade do ar abaixo daquilo que deveriam ser nesta altura em toda a Grande Lisboa”.

"Queixas em dias com boa qualidade do ar"

Produzido pela APA e distribuído na comissão parlamentar de Ambiente, o relatório de investigação ambiental das queixas de poluição do ar em Paio Pires, que analisou o período entre 23 de dezembro de 2018 e 18 de janeiro de 2019, revela que “existem queixas em dias com boa qualidade do ar e em dias com fraca qualidade”.

No dia 01 de janeiro, temos valores elevados em Paio Pires e, segundo a empresa, a atividade esteve parada”, apontou Nuno Lacasta, explicando que “nem sempre é fácil” estabelecer um nexo de causalidade relativamente ao episódio de poluição.

Segundo o relatório, “parece existir uma causa local, que não o transporte atmosférico de partículas, que leva à proliferação de material de maior dimensão junto à povoação, o que carece de investigação ambiental ‘in loco’ – difícil estabelecer uma relação direta entre as queixas e a qualidade do ar medida.

No período analisado pela APA, todas as estações de qualidade do ar da Área Metropolitana de Lisboa – Sul, designadamente Paio Pires, Laranjeiro, Lavradio, Escavadeira e Fidalguinhos, registaram “um comportamento semelhante” relativamente à evolução das concentrações diárias de partículas inaláveis PM10.

Os valores em Paio Pires são os mais elevados, nesse período, mas com evolução próxima da estação de tráfego da Avenida da Liberdade, em Lisboa”, lê-se no documento.

Em relação à Siderurgia Nacional, localizada na Aldeia de Paio Pires, o presidente da APA disse que as matérias mais preocupantes, que “vão merecer continuada avaliação”, estão associadas ao ruído, nomeadamente a instalação das barreiras acústicas, e ao isolamento de zonas de depósito de alguns materiais.

A empresa alega que alguns dos investimentos são incomportáveis, mas a verdade é que estão previstos nas licenças e não vamos deixar de assegurar o seu cumprimento”, reforçou Nuno Lacasta, garantindo que a APA vai “estar, literalmente, em cima da empresa para esse efeito”.

Questionado pelos deputados sobre o impacto deste episódio de poluição na saúde das populações, Lacasta indicou que a situação tem merecido o “acompanhamento constante” das entidades da área da saúde, sem adiantar mais informação.

Neste âmbito, a APA está a fazer a revisão do cálculo da avaliação do ar, “com condições mais exigentes”, que resultam de normas da União Europeia.

Excedências de partículas inaláveis

A estação de qualidade do ar de Paio Pires, no Seixal, registou, desde o início deste ano e até terça-feira, 14 excedências ao valor limite diário de partículas inaláveis, segundo o vice-presidente da CCDR de Lisboa e Vale do Tejo.

Ontem [terça-feira] houve uma nova excedência”, avançou José Neto, da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT), somando esta às 13 excedências registadas em janeiro.

Na audição parlamentar na comissão de Ambiente, requerida pelo PCP, sobre os problemas ambientais na Aldeia de Paio Pires, o vice-presidente da CCDR-LVT indicou que, “na última década, as concentrações de partículas têm sido diretamente influenciadas pelas emissões de unidades industriais localizadas no parque industrial da Siderurgia Nacional”, empresa localizada a “cerca de 500 metros” da estação de qualidade do ar de Paio Pires.

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